A centenária Guarda de Congado de Santa Efigênia, uma das mais tradicionais de Conselheiro Lafaiete, celebra em 2025 seus 100 anos de história, fé e resistência cultural. Com raízes profundas na ancestralidade africana e na religiosidade popular, a Guarda é símbolo vivo de uma cultura que resistiu ao tempo e à exclusão social.

A tradição do Congado em Lafaiete, marcada por forte religiosidade e identidade afro-brasileira, é um dos pilares da diversidade cultural local. Essa manifestação, que une espiritualidade e ancestralidade, tem origem nos povos africanos escravizados que, mesmo diante das mais duras condições, trouxeram consigo práticas e crenças que formaram parte essencial da identidade brasileira. O Congado, nesse contexto, surgiu como expressão de resistência e afirmação cultural.
Conselheiro Lafaiete se destaca nacionalmente por sua tradição congadeira, com mais de uma dezena de guardas atuantes. Essa importância foi reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), no dossiê “Saberes do Rosário: Reinados, Congados e Congadas no Brasil”, publicado em 2023. O documento destaca a influência do Congado lafaietense em diversos estados brasileiros. Ainda em 1924, o modernista Mário de Andrade já havia identificado essa manifestação como um patrimônio cultural brasileiro.
A Guarda de Santa Efigênia, atualmente sediada em Lafaiete, tem origem na antiga localidade de Estevão Marques, em Santana dos Montes. Embora o ano de 1925 seja usado como marco de sua fundação — atribuído por André Cruz, um dos integrantes mais antigos — acredita-se que sua história remonte a um período anterior.

O primeiro capitão da Guarda após sua mudança para Lafaiete foi o senhor Odorico Reis. Com sua saúde debilitada em 1996, foi substituído pelo filho Gamai Ladislau durante uma apresentação em Rezende Costa. Após o falecimento do pai, em 2001, Gamair assumiu oficialmente a liderança, mantendo até hoje o comando com dedicação, fé e forte laço familiar. Ele é pai de sete filhos, além de netos que seguem seus passos na Guarda.
Reconhecido por sua atuação, Gamair recebeu, em 2022, o título de Doutor Honoris Causa pela Faculdade Febraica e pela Ordem dos Capelães do Brasil (OCB), homenagem reservada a personalidades de grande relevância.
Com emoção, Gamair relembra a própria trajetória, iniciada aos 18 anos, incentivado pelo tio Antônio Augusto Lopes, o “Antônio Marinheiro”. Após a morte do tio, herdou sua farda e capacete, símbolos que até hoje carrega com orgulho. Entre as lembranças, destaca as festas de Congado em Santana dos Montes, que duravam três dias, e os doces de mamão servidos durante a celebração — sabores que adoçam a saudade dos tempos passados.
A Guarda de Congado de Santa Efigênia é a primeira de Lafaiete a completar um século de história, mantendo viva uma tradição que representa a força de um povo e a riqueza da cultura afro-brasileira.
(Texto de Luiz Otávio da Silva – pesquisador independente, graduado em Letras, pós-graduado em História e especialista em Patrimônio e Arqueologia.)